O começo de tudo.
No início... Bem no início de minha caminhada, me fora apresentada uma tal de leitura. Me enrolei em seus sentidos, e debruçada diante de todas as brilhantes maravilhas que me proporcionava, eu me mantive. Quando senti, longinquamente o consciente exigir mais, me ergui e me pus a desbravar um mundo de curiosidades. Tropecei em uma técnica de expressão chamada escrita. Desde então, passei a aderi-la.
Foi quando decidi, obstinadamente, que esta deveria ser o meu refúgio particular. E de lá para cá, confesso, venho realizando descobertas inimagináveis. A prática contínua da escrita, me fez adentrar e conhecer mundos dos mais variados tipos que existem. Só então percebi que não se pode limitar a imaginação. É tudo muito maior do que se parece. E abusando disto que chamo de dom, cheguei à seguinte conclusão: Ler, não é somente adquirir conhecimento; Escrever, é mais do que dar rumo ou designar acontecimentos, é possuir o controle do mundo e ter o poder de fazer deste, o que quiser.
quarta-feira, 19 de dezembro de 2012
quinta-feira, 13 de dezembro de 2012
Dó, ré, mi, vida
Um dois três. Lá estava eu, subindo lentamente as escadarias da catedral. Mais quatro etapas de três degraus e o topo seria meu. O sol já se punha, anunciando o cair sossegado da noite. Não fosse pelo soar melancólico do violino no piso à direita, estaria preso ao eco infindo do silêncio. As mãos umedecidas pelo suor que me percorria por inteiro; os lábios ressecados pelo sereno. O ar me faltara quando me puis a atravessar o hall em disparada para a sala de onde a suave melodia estava a me convidar. Ainda de longe reconheci as doces notas altas a serem alcançadas, o choramingo contínuo gravemente a ser prosseguido com o vibrar das cordas do piano enquanto dialogavam em meio a sintonia.
Rompi a sala, eis que pairara o silêncio. O violino retornava lentamente e lamentava, estridente, choroso. Dara tempo, a voz vinha doce, amiga, e arrancava de mim suspiros, e tirava de mim as desesperanças, e trazia para mim, num ritmo profundo, uma sensação aguda, um perder-se elouquente, um viver intenso, quase como as lamentações do violino ou o protoestar incessante do piano que estiveram a me conduzir sem rumo para fora do eu-sem-música-eu-sem-vida... para fora de mim.
sexta-feira, 16 de novembro de 2012
quinta-feira, 1 de novembro de 2012
domingo, 26 de agosto de 2012
O rancho das colinas adormecidas
Passava por ai, desolado, sentimental. A estrada revestida
com as folhas esvoaçantes, talvez perdidas. Sob o sol que iluminava aquela
tarde de primavera, a brisa suave vinha sutil e lentamente acariciar-me a face
serena, tranquila e pra lá de iluminada.
Caminho aquele que, percorria muitos e muitos anos seguidos;
que conhecia muito melhor do que as fases de minhas circunstâncias. Guiado pela
minha própria liberdade e acompanhado por uma solidão costumeira e
impremeditada, eu fazia um trajeto há muito decorado.
Chutava uma pedra aqui, outra ali. E lá apanhava uma rosa. Bem
me quer, mal me quer; iam-se as pétalas, apostadas em um sonho incerto, um
desejo concreto. Bem sabia que viria, não sabia quando. No entanto, não parava
nunca. Bem me quer, mal me quer. Prosseguia assim. Com um sorriso e nenhum
tostão no bolso. Tão rica essa simplicidade que a vida esbanjava, que ser
humano nenhum ousava contrariar.
Aproximava-me dum riacho, cuja extensão rodeava um dos
ranchos mais bonitos de todo o pedaço -, instalado num belíssimo e agradável ambiente
generosamente arborizado, de onde podia observar nitidamente a donzela mais
bela de toda a redondeza.
Nem as rochas cinzas pelos arredores conseguiam cobrir tão
primorosa beleza; nem as cristalinas águas escondia tamanha delicadeza. Os
cabelos louros percorriam-lhe os ombros nus. A pele branca e brilhante
contrastava-se sob os raios do sol; um sorriso doce, tão doce que podia sentir
na pele a sua maciez.
Seu olhar acarinhando-me o coração, o fulgor emitido e
penetrado em meus poros; o perfume a ser confundido com o aroma suave das
rosas, das flores; a textura colorida que a cobria enquanto levava tão
descomplicadamente a vida, invadia-me o ser, o consciente. Sua sede de viver
enchia-me de um desejo curioso, da vontade de beijar o destino como se a
promessa fosse sempre da felicidade absoluta... e quase absurda, como a que eu
sentia naquele momento – o que passei a chamar de glória, de sonho, de amor, de
viver – e que tornou-se tão rapidamente o meu próprio fundamento de vida quando
conheci a donzela do rancho das colinas adormecidas. E se não um amor
silencioso, o que era? O que era que por ela eu sentia... silenciosamente?
sexta-feira, 13 de julho de 2012
Depoimento de vingança: a confissão
Bati a porta do carro e dei a
partida, rompendo as curvas sinuosas daquela estrada escura... sombria de tão
deserta que estava. Mas nada que me fizesse recuar. Tamanho era o meu
sentimento de repulsa!
Ao passo que reduzi minha
velocidade, desdobrei um mapa antigo sob o banco do passageiro. Visto que ainda
tinha pouco mais de 2km para percorrer até alcançar o meu destino, arranquei
como habitualmente fazia, deixando para trás a divisa com a fronteira.
Estava próximo. Havia acabado de
adentrar uma cidadezinha mórbida na costa leste do Tenessee, onde
lamentavelmente tive de estender minhas raízes quando jovenzinha. Até que perdi
meus avós, vindo a conviver com minha mãe e o inconsequente do meu padrasto,
aquele por quem procurei desde quando minha integridade fora arrancada de mim.
Devo-lhes dizer que havia tempos
que ansiava por apanhá-lo e com minhas próprias mãos fazer daquele patife
miserável em pedaços. Tudo o que eu queria – se fosse possível – era dilacerar-lhe
o coração. Faltava pouco, e eu de algum modo sabia que não tardaria a encontrá-lo.
Estacionei o carro, saltando em
baixo de um velho posto de gasolina abandonado e decidi concluir o meu percurso
a pé. Ao longe podia ver pouco mais do que dez casas situadas num lugar
descampado e sem qualquer fonte de energia elétrica. Deduzi que não diferente
de vinte anos atrás, os lampiões caseiros eram ainda a salvação para os
moradores daquele pedaço.
Em passos lentos e tranquilos
segui na direção do morro, cuja extensão era separada das ruas com uma enorme e
enferrujada cancela. Assim que aproximei-me da parte mais alta do morro, fui
bruscamente atingida pelas rajadas insistentes de vento. Permiti-me lembrar de
alguns dos momentos da dolorosa infância que tive. Imediatamente fui invadida
pelas piores sensações já experimentadas por mim até aquele momento. Aqueles
becos apertadinhos, aquelas árvores; os portões de madeira... tudo trazia à
tona as minhas mais temidas lembranças. Sequer lembro-me d’alguma vez que sorri
sem que por dentro eu estivesse apavorada... destroçada em matéria dos abusos
que sofria constantemente pelo companheiro de minha mãe todas as vezes que nos
encontrávamos a sós.
Estava em um de meus momentos
coléricos e estes costumavam ir muito além da consternação. Para transmitir com
exatidão era difícil, uma vez que até os meus suspiros eram carregados pelo
ódio exorbitado que sentia – e este beirava a ira.
Alcancei a ultima casa rodeada
por uma cerca incompleta de arame farpado. Rompi o portão que estava
destrancado, reprimindo-me emocionalmente, tentando assim, encontrar algum
motivo que mantivesse em mim uma porçãozinha de calma e equilíbrio. Meus
pensamentos cruzavam-se dentro da minha cabeça. Estava começando a sentir
dificuldades para respirar; sentia-me perder o controle e rapidamente ser
tomada pela fúria.
Só conseguia pensar em acabar de uma vez com aquilo que me consumia. Taciturna, levei
minha mão até a maçaneta da porta e empurrei-a com toda a minha força. Dali em
diante, fui irracionalmente guiada pela cegueira até onde estava minha mãe
abraçada com aquele avarento do inferno.
“Seus minutos estão contados!”, pensei, lançando-me entre os dois,
enfurecida. Sequer dei-lhes tempo para notarem minha presença.
— Que diabos está fazendo aqui? –
indagou minha mãe.
— Isso mesmo. O que faz aqui esse
ser de outro mundo? — vociferou meu padrasto.
— Vim fazer o que haveria de ter
feito há muito tempo! – retruquei.
Tomada pela raiva que me consumia
o cérebro e os pensares, fechei meu punho atingindo-o no nariz e em seguida a
boca do estômago, levando-o ao chão; e antes que ele tentasse qualquer gesto de
defesa, saquei de baixo de meu casaco o calibre que havia guardado todo o tempo
para um momento preciso como aquele.
— Prometi a mim mesma que você
pagaria por tudo que fez! – enquanto pressionava com força a arma contra sua
cabeça, mantinha-o imobilizado abaixo de meu joelho direito, que lentamente
tirava-o a oportunidade de continuar respirando.
— Por Deus, o que está fazendo?
Explique-me de uma vez o que está acontecendo! – replicou minha mãe,
completamente estatelada, mergulhada em seu próprio pranto.
— Poupar-me-ei das explicações,
mamãe. Não desperdiçarei sequer um segundo. Farei questão de que o ultimo tempo
de vida deste homem seja o pior de sua vida. – guinchei-o, coronhando-o com a
arma. – Por todas as vezes que prendeu-me em casa junto a cama... todas as
vezes que abusou de minha inocência! – repeti os mesmos golpes, cobrindo-o com
o próprio sangue. – Saia daqui de pressa! – ordenei que minha mãe deixasse o
local e quando finalmente ouvi a porta ser fechada atrás de mim, tornei a
observar com atenção a feição daquele por quem fui atormentada toda a minha
vida; e por dentro, nutria um sentimento de pura repugnância... ódio.
— Nunca teve coragem de nada. Foi
e sempre será a mesquinha incapaz de levantar uma agulha sozinha. O que dirá a
apertar um gatilho?
— Eu não tinha... mas veja agora:
eu cresci disposta a compensar todas as tolices infantis que já cometi. –
engatilhei o calibre, mirando-o certeiro no centro da rubra face que se
aquietara na minha frente. — E essa é pela dignidade que você me tirou quando
não pensou duas vezes antes de acabar com a minha vida.
E então eu pressionei o gatilho,
provocando o disparo.
Não só me senti finalmente
vingada, como arranquei de dentro do peito o compromisso que mantive comigo
mesma por todos esses anos. Fiz não o que era certo; talvez nem o que deveria
ser feito, e tendo plena consciência da conduta que me fora atribuída é que
consegui dormir em paz, num pagamento infindo por um crime: um crime que
valeu-me a pena ter cometido.
sábado, 7 de julho de 2012
V i v e r
Quero de pressa viver tudo o que tenho pra viver - para que eu possa viver sem compromissos? Para que eu possa viver.
De que adianta?
De que adianta tantas coisas se não significam nada? De que adianta vir se não for pra ficar? Errar se não for pra aprender? Aprender se não for pra errar de novo? Sorrir se não for real? Chorar se não for de verdade? De que adianta dizer se não estiver sentindo? Sentir se não for recíproco? Esperar se não for fazer melhor? Exigir se não for garantir? De que adianta dizer se não é? Ou ser e não mostrar? De que adianta tudo isso se não for - verdadeiramente - nada?
Me ser acima de tudo
Sou alienada de mim e quero continuar me sendo. Quero cometer erros tolos e da minha melhor forma, ser capaz de reverter... aprendendo por cima de meus vacilos. Se tiver de ir dormir com a cabeça cheia e os olhos pesados por ter passado o dia chorando por algo tolo, quero acordar no dia seguinte, com um sorriso motivado por algo importante realmente. Eu quero espaço, quero tempo... para eu ser o que quiser e quando quiser... e como quiser. Eu quero me pertencer antes de exigir... eu quero me encontrar depois de me perder; eu quero dar vazão ao tempo, quero também fazer das minhas loucuras lembranças absurdas; errar o máximo e aprender ao extremo. Quero me prender para ter a oportunidade de me libertar do meu eu sempre que aprisionar algo que não sirva aos complexos do meu ser.
Apenas ser o melhor
Veja: não digo que sou a pessoa certa. Escuta-me: estou dizendo que quero ser o melhor pra você. E se preciso, irei te conquistar uma vez... e outra e outra e outra e sempre.
quinta-feira, 14 de junho de 2012
A sobra do que restou
E então eu saí. Peguei tudo o que eu ainda tinha. E tudo o que tinha era parte do que sobrou da esperança que eu mantinha. Mas o meu erro, veja, foi pensar que ao fechar aquela porta, você viria atrás de mim. Acreditei que todos os sorrisos, as juras de amor, promessa de uma vida feliz, sonhos multiplicados e desejos realizados fossem sinônimo de amor garantido. Que estupidez a minha, não?
terça-feira, 12 de junho de 2012
E então a hora da despedida chegou...
Era tarde nublada. A avenida principal estava coberta pela impaciência dos pedestres apressados.
Para onde eu ia? Não sei dizer.
Ficar parada, completamente refestelada frente a estação ferroviária certamente me parecia uma ótima ideia. Ainda assim, eu tinha a opção de correr, desesperar-me no meio daquela multidão desgovernada que rumava... quase sem rumo pelas ruas sinuosas.
Mas... naquele momento, exatamente naquele momento, eu não queria fazer o mesmo. E eu devaneava enquanto me fazia observar tudo e a todos. Quantas pessoas... e cores... e carros!... Os edifícios começavam a acender suas luzes. Os faróis dos automóveis, os semáforos...outdoors. Tanto brilho! Tudo muito cheio de vivacidade.
Pelas calçadas... os senhores da rudeza; os jovens despreocupados... inconstantes... ora desalentados. Ao meu lado - bem no canto da esquerda -, uma cabine telefônica cujos vidros encontravam-se inteiramente rabiscados; À minha direita, mais a frente, um ponto de táxi bem miúdo. E sob uma banqueta velha, um senhor a me observar. Longinquamente retraído, aparentemente solitário. Não muito diferente de mim.
O que eu fazia ali? Não sei. O que exatamente eu via ali? Não sei. O que eu procurava ali? De novo: não sei.
Não sabia, mas me tornei uma deles. Uma pobre coitada, sem rumo... e naquele momento, sem nada além de um maço de cigarro quase vazio no bolso do jeans apertado que vestia.
Eu também estava vazia. Mas quem iria saber?
Tudo o que eu vinha fazendo era sentir falta. Tudo o que eu vinha sendo - além de sozinha - pior! - era solitária.
Lembro-me agora: fechei os olhos e perdi-me em simultâneo no tempo. Dessa vez, mantive-me concentrada... que loucura! Meus devaneios sempre implacáveis! Lembranças resgatadas de momentos que se foram... imaginações antes de tudo ingênuas. Iam e vinham, e quando chegavam, me atordoavam.
E como num passe de mágica, elas tornaram-se mais nítidas. Espere!... Não era apenas imaginação.
Eis que surgiu... diante do túnel... perdida? Espere!... não... não podia. Uma miragem?
Não, era real... tinha de ser ela!
Deixei que o cigarro queimasse e rolasse pelos meus dedos compridos e gelados até que caísse no chão.
Eu observava... atônita, sedenta. Eu não poderia estar enganada! Não podia estar! Depois de tanto tempo?
Felicidade... medo... insegurança. Saudade: isso! Era o que eu mais sentia.
O semáforo parado. Ela me deu as costas. Falava no celular... impaciente.
Será?
— Ei... você aí! — chamei em voz alta.
Aproximei-me. Em meio a multidão, minha voz tornou-se inatingível aos seus ouvidos.
Será?
Um virou-se. Outro virou-se e finalmente... sim, era ela! Mas como?
Nunca imaginei que pudesse de novo observá-la tão de perto. Minha nossa! Aqueles olhos... os lábios delicados... nada naquela face serenamente esbranquiçada mudou. Ela estava... estava...
— Atrasada! Muito atrasada! — ela declarou sem ao menos olhar para mim.
— Eu só quero ter certeza... — sussurrei, aproximando-me dela, que se mostrava inquieta.
De imediato ela se virou, encarando-me. Parecia assustada. Imediatamente o celular que segurava encontrou o chão. A bolsa que segurava teria caído se eu não a tivesse segurado.
— O que? Como isso é possível? — fitando-me os olhos, ela enrubesceu.
Céus! Como sentia falta daqueles olhos... daqueles lábios... daquelas mãos delicadas que se mantiveram presas às minhas enquanto segurávamos juntas a alça da bolsa cujo couro vermelho escolhemos em nosso primeiro aniversário de namoro. Como sofri com sua ausência!
— Por onde tem andado todo esse tempo?
Porque sumiu de mim?
— Estive há pouco fora da cidade. — ela esquivou-se, puxando o que lhe pertencia.
Aquele gesto fez-me sentir a pior e mais sombria das sensações, um medo de que ela se perdesse no meio daquele conglomerado e fosse de vez para longe, fugindo completamente do meu alcance... da minha vida.
— O que acha de... você e eu... de repente... conversarmos... Nós poderíamos tentar de novo.
E no lugar daquele olhar que enxera-me sempre de ternura, pude enxergar vagas expressões de angústia.
E antes de virar-se contra mim, ela disse: — Não dá. Não mais.
— Espere... — fechei meu punho em seu braço. Meus olhos tornaram-se turvos, embaçados por um lacrimejar importuno. — Acabou?
Prendi suas mãos nas minhas. Fitei aqueles olhos que pouco a pouco iam revelando-me a verdade que eu não estava pronta para saber, não queria de maneira alguma ouvir, mas que, sob as piores dores, precisava.
Fechei os olhos, inalando o aroma suave que exalava sua pele. Acariciando-a de leve, mirei os olhos que costumavam me observar todas as noites e começava a preparar-me emocionalmente para deixar de uma vez aquele contato desmerecido que eu estava tendo com quem mais soube amar na vida.
— Há muito tempo. — ela disse, tão firme como nunca. Prendeu minha mão e suavemente beijou-a. — Adeus. — e então despediu-se.
Qualquer coisa poderia tê-la impedido de dizer aquilo. Mesmo depois de todas as vezes que a deixei, sim, eu poderia. Mas não sabia disso até aquele momento.
Soltei-a. Perdi a consciência. Senti, como nunca antes, meu coração ser decepado. Uma dor incabível... irrevogável. Não ouvia... quase nada sentia. Simplesmente a seguia com o olhar enquanto se afastava. Indo... indo para longe de mim. E dessa vez, para sempre, talvez, como da última vez.
Para onde eu ia? Não sei dizer.
Ficar parada, completamente refestelada frente a estação ferroviária certamente me parecia uma ótima ideia. Ainda assim, eu tinha a opção de correr, desesperar-me no meio daquela multidão desgovernada que rumava... quase sem rumo pelas ruas sinuosas.
Mas... naquele momento, exatamente naquele momento, eu não queria fazer o mesmo. E eu devaneava enquanto me fazia observar tudo e a todos. Quantas pessoas... e cores... e carros!... Os edifícios começavam a acender suas luzes. Os faróis dos automóveis, os semáforos...outdoors. Tanto brilho! Tudo muito cheio de vivacidade.
Pelas calçadas... os senhores da rudeza; os jovens despreocupados... inconstantes... ora desalentados. Ao meu lado - bem no canto da esquerda -, uma cabine telefônica cujos vidros encontravam-se inteiramente rabiscados; À minha direita, mais a frente, um ponto de táxi bem miúdo. E sob uma banqueta velha, um senhor a me observar. Longinquamente retraído, aparentemente solitário. Não muito diferente de mim.
O que eu fazia ali? Não sei. O que exatamente eu via ali? Não sei. O que eu procurava ali? De novo: não sei.
Não sabia, mas me tornei uma deles. Uma pobre coitada, sem rumo... e naquele momento, sem nada além de um maço de cigarro quase vazio no bolso do jeans apertado que vestia.
Eu também estava vazia. Mas quem iria saber?
Tudo o que eu vinha fazendo era sentir falta. Tudo o que eu vinha sendo - além de sozinha - pior! - era solitária.
Lembro-me agora: fechei os olhos e perdi-me em simultâneo no tempo. Dessa vez, mantive-me concentrada... que loucura! Meus devaneios sempre implacáveis! Lembranças resgatadas de momentos que se foram... imaginações antes de tudo ingênuas. Iam e vinham, e quando chegavam, me atordoavam.
E como num passe de mágica, elas tornaram-se mais nítidas. Espere!... Não era apenas imaginação.
Eis que surgiu... diante do túnel... perdida? Espere!... não... não podia. Uma miragem?
Não, era real... tinha de ser ela!
Deixei que o cigarro queimasse e rolasse pelos meus dedos compridos e gelados até que caísse no chão.
Eu observava... atônita, sedenta. Eu não poderia estar enganada! Não podia estar! Depois de tanto tempo?
Felicidade... medo... insegurança. Saudade: isso! Era o que eu mais sentia.
O semáforo parado. Ela me deu as costas. Falava no celular... impaciente.
Será?
— Ei... você aí! — chamei em voz alta.
Aproximei-me. Em meio a multidão, minha voz tornou-se inatingível aos seus ouvidos.
Será?
Um virou-se. Outro virou-se e finalmente... sim, era ela! Mas como?
Nunca imaginei que pudesse de novo observá-la tão de perto. Minha nossa! Aqueles olhos... os lábios delicados... nada naquela face serenamente esbranquiçada mudou. Ela estava... estava...
— Atrasada! Muito atrasada! — ela declarou sem ao menos olhar para mim.
— Eu só quero ter certeza... — sussurrei, aproximando-me dela, que se mostrava inquieta.
De imediato ela se virou, encarando-me. Parecia assustada. Imediatamente o celular que segurava encontrou o chão. A bolsa que segurava teria caído se eu não a tivesse segurado.
— O que? Como isso é possível? — fitando-me os olhos, ela enrubesceu.
Céus! Como sentia falta daqueles olhos... daqueles lábios... daquelas mãos delicadas que se mantiveram presas às minhas enquanto segurávamos juntas a alça da bolsa cujo couro vermelho escolhemos em nosso primeiro aniversário de namoro. Como sofri com sua ausência!
— Por onde tem andado todo esse tempo?
Porque sumiu de mim?
— Estive há pouco fora da cidade. — ela esquivou-se, puxando o que lhe pertencia.
Aquele gesto fez-me sentir a pior e mais sombria das sensações, um medo de que ela se perdesse no meio daquele conglomerado e fosse de vez para longe, fugindo completamente do meu alcance... da minha vida.
— O que acha de... você e eu... de repente... conversarmos... Nós poderíamos tentar de novo.
E no lugar daquele olhar que enxera-me sempre de ternura, pude enxergar vagas expressões de angústia.
E antes de virar-se contra mim, ela disse: — Não dá. Não mais.
— Espere... — fechei meu punho em seu braço. Meus olhos tornaram-se turvos, embaçados por um lacrimejar importuno. — Acabou?
Prendi suas mãos nas minhas. Fitei aqueles olhos que pouco a pouco iam revelando-me a verdade que eu não estava pronta para saber, não queria de maneira alguma ouvir, mas que, sob as piores dores, precisava.
Fechei os olhos, inalando o aroma suave que exalava sua pele. Acariciando-a de leve, mirei os olhos que costumavam me observar todas as noites e começava a preparar-me emocionalmente para deixar de uma vez aquele contato desmerecido que eu estava tendo com quem mais soube amar na vida.
— Há muito tempo. — ela disse, tão firme como nunca. Prendeu minha mão e suavemente beijou-a. — Adeus. — e então despediu-se.
Qualquer coisa poderia tê-la impedido de dizer aquilo. Mesmo depois de todas as vezes que a deixei, sim, eu poderia. Mas não sabia disso até aquele momento.
Soltei-a. Perdi a consciência. Senti, como nunca antes, meu coração ser decepado. Uma dor incabível... irrevogável. Não ouvia... quase nada sentia. Simplesmente a seguia com o olhar enquanto se afastava. Indo... indo para longe de mim. E dessa vez, para sempre, talvez, como da última vez.
terça-feira, 5 de junho de 2012
Iminência
Todavia, eu espero. Espero pelo que está vindo e também pelo que pode não chegar - é uma forma - bem íntima - que uso para me preparar frente às imprevisões da vida. Isso me poupa das decepções futuras. Mas eu aguardo. Sem pressa me mantenho numa busca incessante pela melhor parte de mim. Numa luta constante comigo contra mim mesma. Eu sinto, a cada passo que dou, é um gosto diferente. Como é doce a felicidade incubada em cada momento e os momentos, quantos! inegavelmente imprescindíveis. Confesso, é agradável.
Não sei se vem, e se vir, não sei quando vai. Por isso aguardo. Sei que meus passos ficaram marcados e provam todos os lugares por onde passei. Sei que o que irá definir a minha caminhada até aqui, não são os obstáculos que surgiram, o que acertei ou os erros que errei, mas sim, a situação em que me encontro: o que aprendi, o que vivi... o que experienciei. Por isso aguardo. E sem pressa, deixo o vento me guiar. Quando der, eu vou. Se não der, eu aguardo.
O desespero é inaceitável quando se vive em um mundo de possibilidades. E nessa de possibilidades, podem existir muitas opções, mas a chance, meu caro... ela é única para todos os momentos. E nessa de achar que as coisas não precisam de tempo para fluir, eu não caio mais.
terça-feira, 22 de maio de 2012
A benção do que é saber amar a si próprio
Existem aqueles entre nós que são abençoados com o poder de salvar o que é amado pelos outros, mas incapazes de usar esta mesma benção para amar a si próprio.
É um dom.
Viver por viver não é viver
O que é poder sem querer? O que é querer sem fazer? O que é fazer sem pensar? O que é pensar sem sentir? O que é sentir sem acreditar? O que é acreditar sem ver? O que é ver sem observar? O que é observar sem entender? O que é entender sem aceitar? O que é aceitar sem conhecer? O que é conhecer sem viver?
O que é viver por viver?
És a minha razão
E por mais que haja objeções, és a razão. O motivo das noites mal-dormidas, os sorrisos desperdiçados porque não vistes; O grito, glorioso... da dor da alegria de não poder compartilhá-lo e mesmo assim partilhando-o (senti)mentalmente. A voz emudecida, obrigada a se calar, rompendo assim, as únicas saídas para uma nova redenção. És a razão. Do pensamento positivo ser negativado pela impaciência de uma espera eternizada pela carência... abstinência de você; Pela falta de tudo e a conquista de nada. Nada quando se trata de uma perda permanente, aquela que se leva junto, para qualquer lugar... para todo lugar. És a razão. A verdade, a mentira... o motivo. A negação sendo afirmada. A certeza duvidosa... a dúvida mais sensata. És a razão. De tudo, de tudo. Da maneira que falo, sobre o que digo e até no porque do que digo. No pouco que exprimo, no muito que omito, na infinidade do que sinto. És a razão.
quinta-feira, 19 de abril de 2012
Será que não percebe?
Será que não vê? Que não escuta?
Todas as minhas lamentações lançadas ao vento; as lágrimas fugitivas, cujos respingares ecoam no silêncio das noites escurecidas pela falta do brilho das estrelas que levastes contigo para onde quer que tenha ido.
E todas as juras que ainda prendo? Todo o amor que ainda guardo? Todas as palavras entaladas - indizíveis até a sua chegada. Todas as lágrimas derramadas, cristalizadas pelo seco da minha angústia, pelo fulgor que exala a força descabida do meu desejo; Toda a minha devoção... fidelidade, sentimentos? Até quando... Até quando terei-os de oprimir, reprimindo minha alma?
sábado, 17 de março de 2012
Ilusão pura
Ilusão! Sei que fui além. Poderia ter me poupado... Mas foi incontrolável. Precisei fazer algo. Amei sem medo, sem segredo.Te sufoquei... Tentei compreender, sofri... Me deprimi...Sem nenhum retorno.
Quando pensei que era um sinal, a esperança floresceu... cresceu. Pura ilusão; desejo não correspondido, sentimento interrompido. E mais uma vez, palavras ditas em vão...
Mas aprendi muito... Hoje minha vida sou eu. E te amar em silêncio foi o que me restou... enfim.
Natureza do meu amor
Sob a linha do horizonte,
Vejo teu sorriso desenhado.
A razão e o sentido da saudade,
Como o futuro, almejado.
Pelos riachos correm
Um sinal da vida, a que eu tinha.
E pelas estreitas bordas,
As sobras, desde a sua partida.
O que será que aconteceu?
O errado dessa história
Foi você ou fui eu?
Quero saber, deixa-me saber:
E se eu, se eu me atirar,
Correr o risco, ir buscar?
Não sei onde isso vai dar,
O final da correnteza.
O que me chama e o que me puxa
É somente a certeza,
O ímã preso à palavra amor.
Quero saber, deixa-me saber:
No final disso tudo, disso tudo,
Você ainda estará lá?
Minha idas e vindas, amor
Numa de minhas idas e vindas,
Conheci-te, amor.
Tão puro, sereno,
Inconstante.
Numa de minhas idas e vindas,
Encontrei-te, amor.
Tão doce, estrategicamente.
Ingênuo quando visto de longe
E nunca experimentado.
Firme e cheio dos mistérios.
Desafio: o caminho até ti.
Estrada de surpresas, tão grandes são!
Um campo de guerra,
Onde os soldados mantêm-se
Numa luta constante.
Guerreando em prol da conquista
Individual.
Guerreiam uns contra os outros.
Jogo de força e agilidade.
Quem vence leva;
Quem perde,
Se entrega.
Mas a tua verdade,
A mais oculta,
É a que não compreendo.
E é proporcional, veja:
Quem te ganha, amor,
É o vencedor.
E quem te perde, amor,
Não sabe, mas já venceu;
Não sabe, mas ter tido-te, amor,
É como levantar o troféu da vitória
Por ter experimentado-te, amor.
Ingenuidade sublime
E ela viera, solta,
Desprotegida.
Pensava que, por ser
Pura, passava despercebida.
Genuína, ela acreditava
Que em sorrisos a vida
Consistia.
O que ela não sabia, é
Que a vida estava a
Muitos passos à frente,
Em sinônimo de maldade.
Inofensiva, tão ingênua,
De tão sublime qualidade.
De tanto que almejava,
Nada obtinha;
De tanto que acreditava,
Seu mundo ao que todos sabiam,
Era aquele que todos desconheciam:
Desigual, irreal.
quinta-feira, 8 de março de 2012
Como praticar a arte do desapego?
"E ela sentou-se, na beirada de uma banqueta perdida naquele bar superlotado de pessoas amorosamente desiludidas. Serviu-se exageradamente com uma dose de apoio e equilíbrio emocional, tentando assim, praticar a tão complicada arte do desapego”.
O mundo e o meu sofrimento
Desligar-se das pessoas do mundo... ou apenas do sofrimento? Já sei. Desligar-me-ei das pessoas do mundo que causam o meu sofrimento.
Continuo te inventando aqui
Que eu saiba sobreviver à tua ausência,
mesmo quando inventar tua presença seja a
única coisa que eu ainda insista em fazer da vida.
segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012
Cúmplices até a morte
E então estávamos nós três, finalmente, frente a frente. Já não era tempo! Estava prestes a saber a verdade, vindo da boca de Lana, eu presumia.
- Vamos, Lana, diga a ele que você não o ama. – Daniel pressionava-a contra mim.
- Não me ama? O que está dizendo, seu canalha? - “Lana, vamos, diga a este imbecil que ele está enganado. Mostre a ele o porque de termos nos casado. Vamos, minha querida, diga alguma coisa.”, pensei comigo, esperando que ela me fizesse o favor de acabar com aquela tortura.
- Não se iluda, meu caro, ela já fez sua escolha. De nada adiantará agora. Acredite se quiser acreditar.
- Lana jamais decidiria alguma coisa sem antes me consultar. Não é verdade, minha querida? – disse. “Não. Ela não faria nada sem me dizer... Ela não faria isso comigo.”
- Pois acho que desta vez ela passou por cima dos princípios do casal e fez. – ele provocava, dissimulado.
Fitei Lana nos olhos, como que implorando para que ela dissesse algo. Ela manteve o silêncio.
- Saia de nossas vidas, seu miserável! Saia antes que eu tenha de lhe expulsar embaixo de tiros! – avancei impetuosamente sobre Daniel. Ele aproximou-se com a mesma velocidade e tentou me atingir com o punho.
- Não! – Lana nos impediu, precisa. – Já chega, vocês dois! – ela se pôs dessa vez entre nós. Diminuiu o tom de sua voz e continuou, dirigindo-se a mim: - John, querido... – seus olhos me fitavam a alma.
- Isso, Lana, acabe com isso de uma vez. Diga a esse paspalho que você foi muito mais feliz comigo e que agora... me escolheu.
Debati-me raivosamente. – Que diabos ele está dizendo, Lana?
Ela chorava. Seus olhos transmitiam uma promiscuidade intolerante, não me davam a certeza que eu precisava. Fitei-a sem esperança alguma, certo de que não teria chance alguma contra Daniel. Foi quando ela confessou: - John... ouça... Daniel e eu... nos deitamos nos últimos dias... – e escondeu a face entre as mãos.
- Não... Impossível... Não pode ser... – fitei-a com uma expressão de completa perplexidade, enquanto Daniel parecia estar comemorando por dentro. – Como pôde, Lana? – eu estava consternado. – Como teve a coragem de fazer isso comigo?
- Da mesma forma que ela está tendo coragem de descartar um ser tão inútil como você. O que ela já havia de ter feito há muito tempo. – Daniel continuou, implacável.
- Acha que me atinge com estas suas palavras petulantemente nocivas, teu imundo? Se for isso que está pensando, desista.
- Pobre coitado... – ele riu, ironicamente debochado. – Não sabe o fim que lhe aguarda, John.
- Você deve ter batido fortemente com a cabeça para pensar que Lana o escolheria. Poupe-me de suas piadinhas insanas, seu imprestável. – Fitei Lana do outro lado da sala. – Vamos, querida... Me diga alguma coisa.
- John... eu já lhe disse...
- Ela me quer, John! Será que você não vê isso? – Daniel insistiu.
- Ora, quanta hostilidade! – o avancei, impetuoso, e com o punho esquerdo acertei-lhe o nariz. Não permiti que ele se levantasse, logo dispersei um chute a altura de seu ombro, inclinando-me para golpeá-lo finalmente... Mas algo me impediu. Espere... O que? Virei para Lana. Baixando o olhar a altura de meu peito tocando no borrão vermelho que havia em minha camisa. Fitei-a, incrédulo e, quase que, sem poder controlar, caí-me de joelhos de fronte para a mulher que segurava entre os dedos a arma que eu carregava na cintura.
Ela me olhou incalculavelmente fria e baixou-se diante de mim.
- John, querido... Me perdoe... eu o amo, sempre o amei... E não poderia permitir que você continuasse em meu caminho.
Lana trouxe sua mão até meu rosto e, aproveitando do resto de equilíbrio que ainda me mantinha ajoelhado, empurrou-me, o que provocou um baque com o impacto no chão.
Não tinha mais forças para falar. Observava-a apenas.
- Lana, não vá, eu te amo... – repetia-me em pensamentos. – Lana! Por favor! – dizia-lhe silenciosamente enquanto lágrimas beiravam os meus olhos.
- Lana... – sussurrei.
- Adeus, John.
Lana se afastou, até que meus olhos não puderam acompanhá-la mais. Sentia-me incapacitado de me mover. Debatia-me descontroladamente por dentro e da maneira mais lenta e dolorosa já sentida antes, a falta de ar me levando... me levando... até a profundidade mais escura e apavorante da inconsciência, da vida que inescrupulosamente me estava sendo tirada.
sábado, 25 de fevereiro de 2012
O Parque Dos Esquecidos
Sentia-me cansada, talvez um pouco tensa. Via que a solução para um bom descanso e algumas horinhas de paz e silencio, era ir ao que eu chamava de parque não freqüentado.
Lá tinha tudo o que eu mais gostava: árvores, lagos, plantas e muito, mas muito verde. Embora eu ainda não compreendesse ao certo o porquê de a prefeitura ter proibido tantas visitas. Era um lugar agradável, afinal.
Já não agüentava mais barulho de máquinas, motores. Sentia-me enjoada quando me punha a pensar em como aquilo me dominada dentro daquela fábrica.
Dia 12/10/05, 18h00. Era véspera do feriado nacional. Saía mais cedo do trabalho, determinada a fazer um percurso diferente dessa vez.
Sem pressa, deixei a fábrica, indo em direção a uma estação de ônibus. Tomei um ônibus tendo como destino, a Praça Albuquerque Boulevard, onde em seu centro, apinhava-se o parque mais frequentado na década de 80, conhecido como O Parque Dos Esquecidos. Não me pergunte, pois também não sei o porquê do nome. Dizem que o motivo é sua beleza tão contemplante e majestosa que nos faz ter quase que um tipo de amnésia quando se tratava dos problemas e preocupações diárias. Complicado de explicar... e entender. Pois bem. De todo modo, devo confessar: amava aquele lugar. Era excepcionalmente arborizado; As árvores muito bem apinhadas e organizadas... cheio de cor e vivacidade. E o melhor de tudo, era tranquilíssimo. Coisa que definitivamente me atraía.
Sem muito chamar a atenção, caminhei em passos lentos até a entrada. Fingi estar observando o canto de ramos florais que havia em frente ao gigante portão do parque. Percebi a distração do guarda e entrei sem que ele percebesse.
“Que bem estar, é outro mundo!”
Aqui me sinto bem, me sinto em casa. Longe de qualquer problema ou tipo de confusão. Permaneci com um leve sorriso no rosto.
“Não entendo. Porque proibir a entrada das pessoas em um lugar como este?”, pensei e sorri inconformada.
Caminhei por entre as árvores, as águas, sob a relva. Apreciando a amplitude esverdeada que me rodeava. Devo lhes dizer, que perdi totalmente a noção da hora. Tudo ali parecia prender minha atenção. Caminhei, seguindo na direção do lago – denominado o mais bonito e limpo da região – sua água era verdinha e cristalina. Acomodei-me em algum lugar em sua beira, debaixo de uma árvore imensa que ali encontrava-se. Era tudo observá-lo!
Sentia-me em paz. Ouvia apenas o barulho das águas a minha frente, o cantar dos pássaros que por ali passeavam e o leve e doce murmúrio das árvores e do vento que soprava lentamente sobre meu rosto carrancudo e cansado.
Devia estar realmente muito cansada, pois não demorei muito e adormeci.
Assustada, despertei. Céus! Já eram 23h00! Levantei-me apressadamente, corri até a entrada do parque. Não avistei ninguém. Procurei algum responsável pela segurança do parque, mas ninguém. Tentei chamar as pessoas que passavam do outro lado da rua, mas era muito longe, não me ouviriam.
“E agora? O que eu faço?”
Caminhei de um lado para o outro sem saber o que fazer. A noite caiu e ficava cada vez mais escura. A única solução que me veio à cabeça era sentar e aguardar até o amanhecer. Talvez conseguisse sair de lá no dia seguinte.
Sentei-me na grama, que já estava úmida devido ao sereno da noite. Tentei me distrair com algo. Não dava. Não conseguia pensar em outro coisa além de sair dali. Comecei a ficar assustada, um desespero que era longínquo se apossou de minha mente fazendo-me pensar no pior.
Levantei-me, voltando a caminhar por entre o parque. O interesse em desfrutar das maravilhas daquele lugar já não era mais o mesmo. Sentia medo.
Procurei um lugar onde eu pudesse dormir. Pequenos barulhos eram suficientes para me aterrorizar. Segui em direção a uma pequena árvore que dava cobertura a um banco revestido por concreto. Estiquei meu avental e me deitei. Ainda sem conseguir dormir, tentava ignorar os sons estranhos que emitiam os animais noturnos.
Pedia, implorava para o tempo passasse logo, mas percebia lentidão. Vasculhei minha bolsa em busca de algo para comer. Haviam apenas os biscoitos que rejeitei no café. Procurei algo que pudesse me distrair naquela noite escura e assustadora. O celular, sem sinal; O rádio, descarregado. Tinha um livro também, mas impossível ler naquela escuridão. Sentia frio. A preocupação me invadia o interior.
01h30 da madrugada. Eu tinha sono. Me deitei no banco, ansiosa para que chegasse o dia seguinte. Felizmente adormeci.
Não tive uma noite boa; me mexia e remexia de um lado para o outro. Concreto não era nem de longe um lugar confortável para se dormir. Mas eu não tinha opção.
06h00 da manhã, 13/11/05. Já estava claro. O celular dentro da minha bolsa despertou, indicando meu horário de sair para trabalhar. Quando me dei conta, não estava em casa. Peguei minhas coisas e saí em disparada para a entrada do parque. Para a minha tristeza, não avistei ninguém. Nem carros passando na via a frente. Não havia sequer algum guarda que costumava rondar por ali àquela hora. Ninguém! Claro... era feriado. Dia de pessoas dormirem até tarde. Ninguém sairia de casa antes das 10h00. Céus!
Sentia dor por todo o corpo. Punha-me a pensar em algum jeito de sair dali. Olhei para o portão. Alto demais. Nem as árvores conseguiriam me levar até lá em cima. Entristeci. Já não havia outro jeito, a não ser esperar.
Avistei uma pequena trilha, a qual não tinha visto antes ou notado quando entrei naquele parque. Aproximei-me e encontrei uma placa. Estava embaçada, era impossível ler o que havia escrito. Três pontos de exclamação apenas visíveis. Não dei importância. Segui-a em frente. Não constei nada de novo... Apenas árvores, árvores e árvores. Estranho. Aquela parte do parque não era como as outras.
Aproximei-me rapidamente do lugar. Via manchas vermelhas nos troncos que havia no chão.
“O que poderia ter acontecido?”
Havia objetos espalhados: um diário, um par de sapatos, canetas, um espelho, e um celular sem bateria. Aqueles pertences foram deixados ali por alguém. Mas quem?
Aquela era uma área reservada do parque; talvez a placa estivesse querendo nos alertar sobre isso. Havia manchas nos objetos também. Peguei o diário e abri-o rapidamente. Ao mesmo tempo, senti um vento forte bater e me arrepiar inteira.
Apanhei o restante dos objetos que estavam no chão. Comecei a ouvir ruídos estranhos. Pensei que fosse o meu estomago, me enganei. Eles continuavam... e me assustavam. Peguei o caminho de volta, deixando aquela trilha para trás.
Ao passar em frente a entrada do parque, ainda não avistei ninguém. Já era 08h00 e nada.
Sentei-me na grama, curiosamente abri o diário. Pelo que via, era de uma adolescente. “Mas por que ela o esqueceria justo aqui?”, pensei. Li com atenção e algo nas ultimas páginas fez um fio de medo percorrer meu corpo.
Ali constava que a adolescente esteve presa naquele parque durante três meses. E acompanhava a seguinte frase: “Cansei de esperar por ajuda. 13/01/06”.
“Céus, é recente! Onde estará ela agora? Estará viva?”. Levei minhas mãos ao rosto, sentindo uma vontade imensa de chorar.
10h45 e as ruas estavam desertas. Parecia não haver mais ninguém daquele lado da cidade. Região vazia! Comecei a perder as esperanças e pensar no pior, como vinha fazendo. Por um instante, deixei o diário de lado. O espelho! Estava quebrado e também com manchas vermelhas. Atrás, a frase: “Já esperei demais. 20/04/06”.
O sapato, sujo, com as mesmas manchas vermelhas. Em sua borda, a mensagem: “Fui vitima de esquecimento. 27/07/06”.
Canetas... apenas sujas. Já não pegavam mais quando as testei. Celular, totalmente sem bateria. Não ligava mais. Atrás, encontrei a seguinte frase e data: “Fiz uma chamada de emergência, mas não fui atendido. 30/10/06”.
Tudo passou como um rápido flashback em minha cabeça. Com esses objetos em mãos, depois de tê-los analisado, pude ter certeza de quatro coisas: Primeira: mais de duas pessoas já estiveram presas aqui nesse parque; Segunda: essas manchas vermelhas... nada de tinta, era sangue seco, deixado pelos donos dos objetos antes de suas supostas mortes;
Terceira: estas canetas serviram apenas para deixar gravado suas frases e o ultimo dia de suas vidas; Quarta: EU FUI ESQUECIDA!
Agora eu entendia o porquê de tudo aquilo... Não tinha mais motivos para continuar ali... numa espera que nunca seria correspondida.
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Passaram-se três meses. O guarda responsável pela ronda trimestral voltou novamente para checar todo o local. Coisa que ele passou a fazer após o fechamento definitivo do parque. E conforme sua busca encontrou objetos espalhados por toda a entrada da trilha proibida para visitantes. Entre cada um deles, mensagens com suas respectivas datas:
No diário: “Cansei de esperar por ajuda” – 13/01/06;
Espelho: “Já esperei demais” – 20/04/06
Celular: “Fiz uma chamada de emergência, mas não fui atendido” – 27/07/06
No sapato: “Fui vítima de esquecimento” – 30/10/06
E por último, no avental: “Cansei de esperar por ajuda, já esperei demais. Precisei de uma chamada de emergência, mas não fui atendida. Fui vitima de esquecimento... assim como todos eles” – 10/01/07.
Prazeres
O pôr-do-sol
O desabafar.
O compreender e o provocar.
A fala mansa
A canção de ninar.
O som que descansa
Ao nos acordar.
O verde das plantas;
O azul do céu
No reflexo do mar.
Antigos costumes,
Novos passa-tempos,
Cantar, correr
Dançar e amar.
Viver.
sexta-feira, 24 de fevereiro de 2012
Um adeus indesejado
Eu chorava. As lágrimas pesavam ao despencarem dos meus olhos. O pulsar de meu coração tornou-se intensamente explosivo quando seu olhar mostrava-se pronto para expor a verdade – aquela que talvez não pudesse aceitar jamais.
Sentia dificuldade para levar aos pulmões o ar que me faltava; os suspiros eram carregados de medo e insegurança.
O peso de meu corpo parecia ter bruscamente aumentado, elevando-se com a mesma proporção de minha ânsia, minha abstinência de você. Um ímã em meu interior insistia em não funcionar, mesmo quando minha alma clamava pela sua no momento em que pensava você em recuar para ainda mais distante de mim.
O mar de lágrimas que se formara antes, deu lugar a um oceano, onde as águas não davam pés. E estas, mornas, percorriam lentamente minha face ruborizada, até que alcançaram meus lábios, fazendo-me lembrar do quão salgado e desgostoso é o sabor da decepção.
E então você se despediu, obstinada. Ninguém que te fizesse parar. Ninguém que pudesse me salvar.
Existe algo tão mais doloroso do que um adeus nunca idealizado, nunca desejado?
Penso agora que não gostaria de sentir, preferiria não sentir, ao invés de ter que suportar algo que estivesse, todo o tempo, me matando por dentro.
Era sentir, ou sentir. Não tinha opção.
Esse é o preço que se paga, por amar e não ser compreendido.
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